A natureza parece brincar com as formas, texturas e cores das espécies e, muitas vezes, proporciona a quem observa o inesperado, como um bicho que parece uma folha ou um pedaço de madeira. Porém, algumas dessas características, que nada mais são do que estratégias para a sobrevivência, parecem verdadeiras obras de arte. São as chamadas !”biocenas”. É isso que um grupo multidisciplinar de pesquisadores pretende mostrar na exposição Arte e ciência das formas e padrões da beleza. “Essas imagens parecem uma pintura ou uma escultura que estão ali no meio do mato, cujo artista se chama evolução”, explica Márcia Moura Franco, bióloga da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).

As sementes da coroa, dispostas num padrão espiral determinado pela série de Fibonacci

 

Notícia na íntegra e mais fotos clique aqui

 

   A mostra, que começa em 9 de agosto e vai até 10 de setembro, no Centro de Visitantes do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, vai utilizar a arte para sensibilizar as pessoas sobre a importância de se conservar o meio ambiente e de lutar contra a sua destruição. Trata-se de uma compilação de fotografias feitas pelos pesquisadores na Mata Atlântica — nas unidades de conservação da Reserva União e do Poço das Antas —, enfatizando formas, padrões e geometria. “As imagens escolhidas foram interpretadas do ponto de vista científico e artístico, na intenção de aproximar o público da natureza, despertando o interesse e sensibilizando por meio da beleza das imagens, que poderão ser vistas em detalhes”, diz Antônio Carlos de Freitas, físico da UERJ e coordenador do projeto.
 
   Para explicar toda a beleza que os pesquisadores pretendem mostrar, o projeto traz imagens da natureza com aspectos associados à forma, à geometria, à textura e ao contexto em que se inserem, relacionados com a função biológica. “A gente costuma dizer que o sapo é feio. Ele não é feio. O sapo tem aquelas proporções de corpo para sobreviver no contexto dele. Então, ele é bonito no ambiente dele. Ele jamais poderia sobreviver sem aquelas proporções”, exemplifica Heloísa Guillobel, bióloga da Uerj e membro do projeto.
 
   Para a bióloga, os humanos tendem a olhar para seres como o sapo e outros insetos e achar que lhes falta algo, porque esse algo está presente em nós, que somos a referência, não neles. “Esquecemos que esses bichos são lindos dentro do contexto deles”, afirma Guillobel. “Acredito que a exposição possa humanizar a forma como vemos esses organismos”, espera a bióloga.
 
   A ideia dos pesquisadores também é mostrar que a arte e a ciência estão ligadas. Para Freitas, essas duas demonstrações humanísticas sempre caminharam juntas. “Um grande exemplo disso é Leonardo da Vinci, um artista e cientista que em muitas de suas obras representou a arte por meio da ciência e vice-versa. Um de seus trabalhos mais conhecidos, o Homem Vitruviano, um desenho feito pelo pintor, mostra a estética do corpo humano associada às suas proporções, baseadas em cálculos matemáticos”, cita o físico.
 
   A matemática, contudo, é outra vertente da ciência presente na natureza. Ela está representada em diversas espécies. Nas árvores, por exemplo, é a Sequência de Fibonacci (1) que determina as posições das folhas nos ramos em torno dos caules, de forma que essas folhas recebam igualmente a luz do Sol. Nos girassóis, sua exuberância está, também, ligada à matemática. “As sementes da coroa são dispostas num padrão espiral determinado pela série de Fibonacci”, diz Freitas.
 
Assimetria atraente
   De acordo com os cientistas, o que é belo para os humanos está representado na simetria, em que nosso olhar procura alguma coisa que possa ser divida igualmente. “É como se uma lateral fosse sobreposta na outra. A falta de simetria nos incomoda”, ensina Heloísa. Porém, a natureza, quando nos apresenta a assimetria, nos surpreende, nos mostra o inusitado. “Isso vai nos trazer o mesmo prazer que temos quando vemos simetria em alguma coisa”, conceitua Guillobel. As borboletas formam belos exemplares de simetria. “Tanto nos desenhos geométricos quanto no contorno das asas”, explica Antônio Freitas. Outro exemplo ocorre quando uma lagarta se alimenta e cria desenhos simétricos nas folhas. “São obras de arte”, define Márcia Franco.
 
   Ainda segundo os pesquisadores, os humanos, por exemplo, são simétricos por fora e assimétricos por dentro. “Para ver essa assimetria, basta abrir o homem. Ele tem um só coração e todos os órgãos de forma assimétrica”, informa Guillobel.
 
   Ao utilizar o critério estético, mostrando imagens da natureza, Antônio de Freitas acredita que a ciência possa ser vista de uma forma mais atraente. “Muitas dessas imagens podem despertar o interesse de crianças e adultos na busca pela informação sobre aquilo, como objeto de estudo ou apenas na conscientização da preservação dos ambientes naturais que ainda restam — e que são perfeitos em beleza e harmonia entre todos os seus componentes.
 
1 - Número de ouro
   A Sequência de Fibonacci, descoberta pelo matémático italiano Leonardo Fibonacci, consiste em uma sucessão de números, tais que, definindo os dois primeiros números da sequência como 0 e 1, os números seguintes serão obtidos por meio da soma dos seus dois antecessores. Portanto, os números são: 0,1,1,2,3,5,8,13,21,34,55,89,144,233,... Dessa sequência, extrai-se o número transcendental conhecido como número de ouro, ou seja, a razão áurea.