Trabalho de mestrado produzido por Eliete Dalla Corte Frantz, do Laboratório de Morfometria e Morfologia Cardiovascular e aluna do programa de pós-graduação em Biologia Experimental do Instituto de Biologia da UERJ, demonstrou que a restrição proteica durante os períodos de gestação e lactação altera a morfologia e o metabolismo dos bebês, que ficam mais propensos a desenvolver doenças crônicas na fase adulta, podendo afetar inclusive gerações seguintes, que tendem a apresentar os mesmos problemas de saúde.
   O resultado da pesquisa, orientada pelo professor Carlos Alberto Mandarim-de-Lacerda, foi publicado como parte dos requisitos para a obtenção do título de mestre no periódico Mechanisms of Ageing and Development, revista científica internacional com alto fator de impacto. Co-orientadora da dissertação, a professora Márcia Barbosa Aguila comemora: “O artigo científico é uma forma de divulgarmos os trabalhos desenvolvidos no Laboratório. A publicação em revistas internacionais de grande impacto demonstra a importância do assunto, que é atual e preocupante, e traz benefícios para o programa de pós-graduação, porque competimos com investigadores de todos os países. Também é uma forma de projeção internacional da UERJ”
   A professora explica que os estudos nessa área da Biologia tiveram início depois da 2ª Guerra Mundial, quando foi detectado que crianças que nasceram naquele período na Holanda apresentavam maior  incidência de doenças cardiovasculares e morriam mais cedo na idade adulta. 
 
   Para entender o que gerava essa situação, cientistas começaram a desenvolver pesquisas experimentais  em animais, principalmente roedores. A dieta manipulada no laboratório da UERJ, que diminuiu a quantidade  de proteína na alimentação de roedoras durante a gestação, permitiu verificar que os  filhotes estavam mais  propensos a desenvolver hipertensão arterial e diabetes na fase adulta porque nasciam com menos células beta que secretam a insulina. Além disso, os pequenos roedores apresentaram pré-disposição para ganhar peso, apesar de receberem uma dieta normal, porque durante a gestação foram condicionados a uma dieta restrita.
   Na pesquisa de Eliete Frantz as genitoras foram divididas em dois grupos. No período gestacional, um grupo recebia alimentação normal e o outro uma dieta com restrição de 5% de proteínas. Apenas a primeira geração recebeu a dieta com restrição – as proles seguintes foram alimentadas normalmente  e foram avaliados  filhos, netos e bisnetos dessas roedoras. “Quando colocamos os animais para acasalar  começamos a restringir a alimentação que vai até o filhote nascer. Analisei apenas as fases iniciais da vida, não cheguei à fase adulta, que tende a piorar os resultados. O roedor desmama com 21 dias, aos três meses é considerado adulto e com seis meses, idoso. Analisei do nascimento até o desmame, ou seja, três semanas”, relata.
   As análises evidenciaram que na terceira geração os  filhotes nasciam iguais aos animais-controle, aparentemente normais. Microscopicamente, porém, observou-se que todos continuavam com os mesmos problemas. O pâncreas, órgão responsável pela regulação metabólica do organismo, constituiu o foco do estudo. O principal produto do pâncreas é a insulina, ligada ao diabetes, e a estrutura microscópica do seu tecido é dividida em ilhotas. “O padrão microscópico que observamos nas ilhotas dos grupos-controle corresponde a uma massa de células beta bem organizadas no centro e, na periferia, outrascélulas.
   Nos restritos da primeira geração observamos células mais desorganizadas, descentralizadas e com o diâmetro reduzido. Esse foi um padrão que se repetiu nas demais gerações”, observa a pesquisadora. Os filhos, netos e bisnetos, de acordo com o estudo, se mostraram hipoinsulinêmicos, com ilhotas e células betas menores. Apesar de a massa corporal ser diferente nas três gerações, quando avaliada microscopicamente mostrou o mesmo comportamento. Uma das hipóteses da pesquisa é de que o aumento da incidência do diabetespode ser explicado pela alimentação materna, que afeta os filhotes, e estes, por sua vez, vão sofrer as consequências e reproduzir outros  filhotes com alteração no pâncreas.
   No caso dos humanos, isso significa que “em uma população que não tem recursos para comprar carne e leite, porque a proteína ainda é cara, as pessoas compensam a alimentação com farinha e massas. Basta diminuir a proteína, que durante a gestação deve ser consumida em maior quantidade, para causar a mesma alteração verificada na pesquisa”, avalia a professora Márcia. Ela explica que disseminação de fast foods e de uma alimentação carente em nutrientes e muito energética também pode agravar a programação metabólica: “Isso pode ser observado nas pessoas com tendência a engordar. A explicação é que elas têm genes poupadores, pois durante a formação da fase fetal foi acostumada com pouca proteína e teve que se adaptar a esse meio”.